segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

Prazer de condução

Quando se fala em prazer de condução as primeiras letras que vêm à cabeça são BMW, particularmente por causa da publicidade lamechas que associa os automóveis ao estilo de vida. Ou então fazem como eu e imaginam um DB9 a viajar por estradas secundárias nas montanhas italianas. Ou melhor ainda e pensam como futebolistas e sonham com um Mercedes GL500 a passear nas docas à noite enquanto os bancos massajam as vossas costas como se fossem os pés de duas raparigas asiáticas vestidas apenas com uma toalha. Mas para mim, hoje à tarde, o prazer de condução chegou numa forma pequena... E vermelha.

Um Renault Clio RL, 1.2 a gasolina de 1993. Este automóvel foi o primeiro Renault a receber motor Energy com injecção monoponto. Infelizmente este exemplar não está exactamente como no dia em que foi comprado. Está magoado e amolgado, repleto de insectos, manchas e poeiras. A cor das portas não é exactamente a mesma do resto da carroçaria as jantes parece que foram recuperadas de um galeão espanhol afundado. A luz no painel de instrumentos que nos diz que os indicadores estão activados não discrimina entre esquerda, direita ou quatro piscas.
A caixa de velocidadades é feita de pedra e a manete assemelha-se a uma colher-de-pau numa panela de sopa grossa alentejana. A velocidade também não está exactamente ao nível de um Veyron. Os 0-100 km/h ocorrem apenas em cerca de duas eras glaciares. O som que ele faz parece uma orquestra, a ser corrida a tiro durante uma interpretação da 9ª Sinfonia. Há chiadeiras que parecem ter origem em cerca de cem peças diferentes. Os bancos causam-nos mais dores nos rins do que se estes estivessem a ser retirados para serem vendidos no mercado negro e há um cheiro esquisito a sumo de laranja azedo a vir de debaixo do assento do passageiro. Mas devo dizer que este é um dos melhores carros que já conduzi...


O David numa pose que pede mesmo publicação no hi5. Feito.

Hoje tinha combinada uma viagem com o David e o nosso próprio "Captain Slow" Duarte Santos. Mas o Duarte decidiu que entreter familiares em casa era mais importante que não fazer nada e deixou-nos aos dois sem ideia para onde ir. Decidimos seguir em direcção a Loures, depois Caneças, depois Mafra e finalmente, até à Ericeira. Chegámos mesmo a tempo, pois testemunhámos um pôr-do-sol verdadeiramente espectacular que nos pôs a pensar nas nossas caras-metade que desejávamos que estivessem ali connosco. O mais importante não foi o destino, mas a viagem.
A verdade é que aquele caixote vermelho, com todas as suas amolgadelas, chiadeiras e aromas a fruta podre nos levou e nos trouxe a cantar pelo caminho, a desejar que dia nunca acabasse. A maneira como aquele pequeno carro se comporta em estrada, o contentamento que é conduzi-lo, a sensação de liberdade que trasmite. É épico. Porque, no final, não é a potência, o luxo nem a velocidade que nos faz gostar de um carro, é como ele nos faz sentir. Naquelas horas esqueci BMWs, Mercs e até Astons. Aquele pequeno balde de diversão era tudo o que interessava.


João Neves

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Pequenas Emoções

Sempre gostei de ouvir música onde quer que estivesse. Ao longo dos anos tive leitores de cassetes, leitores de CD portáteis e, mais recentemente, leitores de mp3. Digo "leitores" porque tive vários de cada. Por vezes acho que sou incompatível com determinado tipo de tecnologia, pois estes leitores, especialmente os leitores de CD, ou famosos diskman, tinham o malvado hábito de avariar quando atingiam alguns meses de vida. E, admito, lançá-los contra uma parede quando deixavam de funcionar não vinha no capítulo de resolução de problemas do manual do utilizador, embora me ajudasse a relaxar depois de horas de nervos a tentar pô-los a funcionar. Passando aos leitores de mp3. O meu primeiro leitor de mp3 foi um Creative "qualquer coisa" com 128mb de memória. Sejamos honestos, se essa coisa dos megabytes fosse espaço real onde tivessemos de guardar a nossa colecção de CDs, 128mb seria o equivalente a um pequeno porta-moedas. Mas funcionava bem, e dava perfeitamente para ouvir música suficiente até chegar à escola. Digo 128mb chegavam porque eu demorava cerca de 15 minutos. A pé. Hoje sou um saudável jovem universitário que demora cerca de duas horas e meia a chegar à universidade. Por isso considerei outros leitores. Entretanto tive até um de 3gb que funcionava muito bem até ao dia em que "morreu". Voltei para um de 1gb no qual não conseguia organizar playlists, o que se tornava frustrante, porque não consigo parar de rodar o botãozinho para seleccionar o que quero ouvir, e assim gastava as pilhas em menos de nada.


Um dia estava numa loja de um centro comercial e vi o tal iPod, coisa fashion que tanta gente atraía nos lançamentos mundiais, levando pessoas a dormir na rua só para terem um. Cedi à tentação e comprei uma coisa chamada iPod nano, com 4gb, o que já é suficiente para guardar a música do dia-a-dia.

Então, no que toca aos leitores mp3 há o iPod, e os outros. Isto da moda é mesmo estranho. Do mesmo modo que se se procura um carro citadino há o Smart, e os outros. Desde que surgiu o Smart tem sido um ícone do urban-chiq (se é que existe tal coisa) e além de ser um acessório de moda, é prático! Senão vejamos, onde se estaciona um Ford Mondeo, consegue-se estacionar três Smart ForTwo. Ok, se quiserem levar a trouxa quando forem de férias mais vale escolherem uma estância para nudistas, a mala é minúscula. Mas no dia-a-dia, na azáfama da cidade, o Smart mostra trunfos. Além do mais é estúpidamente económico. Motor de 800cc hoje em dia é uma mais-valia para a carteira. Além do mais é um Mercedes, o que é muito bom quando se compara à concorrência. Mas honestamente, um Smart ForTwo não faz maravilhas pela nossa masculinidade. Mas felizmente há uma versão ligeiramente mais desportiva, o Roadster.
"(...) se quiserem levar a trouxa quando forem de férias mais vale escolherem uma estância para nudistas, a mala é minúscula"

O Smart Roadster é o urban-chiq versão masculina. Continua pequeno e com motor de frigorífico, mas para o que é, é espectacular - 800cc de pura emoção. Sei de quem estará certamente a discordar de mim e a relembrar a mais recente visita à feira de usados da FIL, mas eu não escolheria o Hyundai Coupé sobre este. Este ForTwo com nariz e traseira é perfeito para a condução citadina e tem como vantagem face ao seu primo redondo o facto de não nos fazer parecer que estamos a conduzir um pequeno sofá de duas cores. Os 82cv são suficientes para o seu peso, que se aproxima ligeiramente de um átomo de oxigénio. Há no entanto um pequeno problema, pelo menos para quem tem mais que um metro de altura, entrar e saír dele. O espaço lá dentro também não mostra semelhanças com nenhum armazém, mas a posição de condução é brilhante. Se quiserem o Roadster pensem e gastar pelo menos duas semanas a fio fechados na garagem a aprender a entrar e saír dele com estilo, senão façam-me um favor: quando encontrarem as vossas amigas ao volante, estacionem longe e vão ter com elas a pé, é o melhor que fazem ao vosso ego.
"Os 82cv são suficientes para o seu peso, que se aproxima ligeiramente de um átomo de oxigénio."
Este então será a escolha para jovens que não podem investir, digamos, num Z3 ou Mini usados mas querem a adrenalina de um pequeno roadster. E digo-vos já, elas não desgostam nada do Smart Roadster. Aparentemente segundo um estudo levado a cabo por...bem... por mim, elas acham-no "fofinho" e "giro". O que pode ser que as leve a dar uma volta nele. Não?

JN

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Cuore Sportivo

Alguma vez estiveram num supermercado e perguntaram porque é que a garrafa de Real Lavrador está a um euro e pouco e a de Camigliano Brunello di Montalcino 98 toscano está a sete contos na moeda antiga? São os dois vinho? São. Vêm ambos em garrafas de vidro mais ou menos parecidas, ambos têm rótulo de papel, rolha de cortiça... Para quem não aprecia vinho sem ser com a santa da sardinha não faz muito sentido pagar não-sei-quantas vezes mais por algo que pode perfeitamente ser substituído com algo mais barato. O mesmo se passa com os whiskys, dos quais sou grande apreciador devo dizer. Ora senão vejamos: um Cutty Sark ou um Jameson's, ambos whiskys mais jovens, malte; o J&B, Logan's, William Lawson's, whiskys mais séniores, sabor mais intenso. Todos estes vos darão o sabor de um bom malte, sem dúvida. Mas o nosso olho foge sempre para a garrafinha bonita na caixa de madeira que diz James Martin's 20 Years Old. Porque será que é tão caro? Mesmo das marcas mais correntes de 15 anos faz assim tanta diferença? A questão é que honestamente não sei.

"Mondeo é Ford. Mustang é Ford. Mondeo é Mustang? Não. Mas... E se fosse Mustang Light?"

O mesmo se passa com os carros. Compram um Mondeo. Mondeo é Ford. Mustang é Ford. Mondeo é Mustang? Não. Mas... E se Mondeo fosse Mustang light? Claro que não é. Mas há uma marca que faz Ferrari e Maserati light. Não há uma única alma neste mundo automóvel que não a conheça as palavras Alfa Romeo. Uma marca italiana quase centenária que a maioria conhece devido aos sérios problemas de fiabilidade. Mesmo se conhecerem só as piadas sobre ela. Sim, é assim tão má.


Fazemos fast-foward 97 anos na história da Alfa (fundada em 1910, por isso não se matem a fazer contas, é hoje). Vinha na Infante Dom Henrique quando reparo num BMW Série 3 dos novos, um E90 em preto, provavelmente um 320d. Pensei "sim senhor, aí está um carro para mim" quando o meu pensamento foi interrompido por um Alfa GT preto estacionado a cerca de 10 metros do Série 3. E o pensamento ficou por aí. A verdade é que ao ver o Alfa ali todos os pensamentos de condução segura, precisa e formal do alemão se esvaniram. De repente eu só queria estar ao volante do Alfa numa longa estrada secundária com uma paisagem de tirar o fôlego. Esqueçam iDrives e mariquices. Esqueçam terem um carro com o qual possam sempre contar que funcione. Eu queria o Alfa.

E não é só o distintivo no capot. Senão vejam, ponham os seguintes lado a lado - BMW Série 3: excelente comportamento, o eterno rival do Mercedes Classe C; Volvo S60 - tão seguro que coçar as virilhas passa a desporto radical; Lexus IS220 - é bonito, lá isso é, mas é japonês e enfadonho; Alfa Romeo 159. Digam honestamente que o 159 não é o mais bonito de todos eles. Aquela grelha triangular, aqueles seis faróis, aquela linha do capot, aquela traseira... Lá dentro também se destaca da concorrência. Linhas muito mais arrojadas que fazem os engenheiros alemães gritarem "Nein!!!" e puxarem os cabelos. Não posso dizer muito mal deles, pois é graças a um alemão que a Alfa Romeo melhorou e muito em termos de construção... Mas enfim, são tipos engraçados.

"Aquela grelha triangular, aqueles faróis, aquela linha do capot (...). Linhas muito mais arrojadas que fazem os engenheiros alemães gritarem "Nein!!!" e puxarem os cabelos."

Deixemos o 159 e o 156 de duas portas, perdão, o GT, de lado. Vamos para o que na minha honesta opinião é um dos carros mais lindos que se podem ver hoje na estrada, o Brera. Esqueçam a Mona Lisa, esqueçam a Capela Cistina. Isto é a obra-prima italiana! Em preto fica mais sexy que os posters da Cláudia Vieira nas paragens de autocarro. A Alfa Romeo conseguiu algo que transmite a paixão e alma dos grandes desportivos italianos ("apenas" dos Ferrari e Maserati) para as massas em termos de prazer de condução e diversão. A linha é do 159 mas mais desportiva. Um coupé de linhas perfeitas. Simplesmente espectacular.


Sem dúvida, cuore sportivo.


João Neves